Artigo | Somos todos normopatas?

Diario de Pernambuco

* José Adelmy da Silva Acioli é presidente da Associação de Magistrados do Trabalho da 6ª Região (Amatra VI) e da Academia Pernambucana de Direito do Trabalho


* Artigo publicado no Diario de Pernambuco na quarta-feira, 12 de outubro de 2016.


 


Normopatia é um termo utilizado pela psicologia para definir a personalidade humana conformista, pouco imaginativa e altamente integrada aos padrões sociais. Segundo Dejours, em tais indivíduos há uma retração da consciência intersubjetiva, passando eles a transitar sem culpa, angústia ou embaraço em um mundo proximal que lhe é adjacente e concêntrico. Em contrapartida, essas pessoas são absolutamente alheias ao mundo distal, isto é, dos outros seres humanos, promovendo a abolição das faculdades do pensar, julgar e agir. Arendt já referenciou sobre isso, embora sob outra perspectiva, quando analisou a personalidade de Eichmann. Também Marcuse discorreu sobre o fenômeno ao abordar o homem unidimensional destituído da dimensão crítica do seu viver.


Diante dos fantasmas da miséria, do sofrimento e da exclusão, os indivíduos se põem antolhos e são incapazes de enxergar o que se apresenta ao seu redor. Seu egocentrismo é responsável pelo triunfo da racionalidade econômica cruel e pela perenidade do discurso dominante distorcido e desinformador. Não lhes importa a precaridade do outro. Não lhes interessa se a divisão social do trabalho marginaliza os jovens, os mais velhos, as mulheres, os estrangeiros e outras minorias. Não é da sua conta se o governo fechou questão sobre a reforma previdenciária que achatará os benefícios previdenciários ou se a reforma trabalhista também já anunciada flexibilizará permanentemente os direitos trabalhistas em geral ou, ainda, se está em curso o desmonte da Justiça do Trabalho e da independência da Magistratura e do Ministério Público do país.


Sem uma consciência moral ampliada para o mundo distal, ficamos paralisados e incapazes de reagir coletivamente. E sem reação, ficamos rendidos à degradação do nosso viver. Permanecemos sob o regime do medo e admitimos a existência de um futuro despótico e cheio de incertezas.


O comportamento normopata sufoca o civismo, perpetua o sofrimento, garante privilégios e sustenta a exclusão. É necessário resistir e se formar um senso crítico mínimo em relação às reformas das garantias sociais que se avizinham. Resistamos, então, como Terêncio, para dizer: “Sou homem: nada do que é humano reputo alheio a mim”.